Páginas

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Umbanda - Início de uma longa jornada - Parte II

Dando continuidade ao nosso estudo sobre a história da Umbanda, baseando-nos na reportagem de Lilia Ribeiro, no post de hoje é abordado sobre a fundação da primeira Tenda de Umbanda no Brasil, demonstrando de maneira resumida como se procedeu o dia 16 de novembro de 1908.


"No dia seguinte, 16 de novembro de 1908, na residência do jovem médium, na rua Floriano Peixoto, 30, em Neves, bairro de Niterói, a entidade manifestou-se pontualmente no horário determinado, 20 horas.

Ali se encontravam quase todos os dirigentes da Federação Espírita, de certo para verificar a veracidade do que fora declarado na véspera; os amigos da família, surpreendidos e incrédulos e grande número de desconhecidos, enfermos, aleijados, que ninguém saberia dizer como haviam tomado conhecimento do que ocorrera. E muitos deles, ao final da reunião, estavam curados. Foi essa uma das primeiras provas da missão que a entidade vinha cumprir.

O Caboclo das Sete Encruzilhadas estabeleceu as normas do culto, cuja prática seria denominada “sessão” e se realizaria à noite, das 20h às 22h, para cura de enfermos, passes e recuperação de obsedados. O uniforme a ser usado pelos médiuns seria todo branco, de tecido simples; o atendimento, inteiramente gratuito. Não haveria atabaques nem palmas ritmadas para acompanhar os cânticos.

A esse novo culto, a entidade deu o nome de Umbanda e declarou fundado o primeiro templo para a sua prática, com a denominação de Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, porque “assim como Maria acolheu em seus braços o Filho, a Tenda acolheria os que a ela recorressem, nas horas de aflição”.

A UMBANDA É A MANIFESTAÇÃO DO ESPÍRITO PARA A CARIDADE, acrescentou.

É comum ouvir-se dizer que Umbanda foi trazida ao Brasil pelos escravos. Entretanto, o testemunho dos pesquisadores nos faz saber que os negros não davam aos seus cultos a denominação de Umbanda. O vocábulo era praticamente desconhecido entre os cultores das seitas africanas.

Isso não exclui o papel relevante que a crença dos negros desempenhou na formação da Umbanda, da qual se constituiu um dos principais alicerces, dando-lhe, como contribuição primordial, os Orixás.

Negros e Índios tiveram, de certo, a missão de implantar em nosso país, as bases sobre as quais se havia de erguer a mais brasileira de todas as religiões. Já que, de sua constituição, participaram as três raças que constituem o nosso próprio povo.

A Umbanda, em suas práticas, aproxima-se mais da origem nativa do que da africana. Em sua estrutura, porém, prevaleceu a influência negra.

Os conceitos da reencarnação e da comunicação com os desencarnados, já existentes no culto dos nativos, foram reforçados pelo Espiritismo, através de sua doutrina esclarecedora.

O Catolicismo deu valiosa contribuição à Umbanda; em grande parte, por influência do negro, ao qual havia sido imposta a assimilação do Orixá ao Santo; e também através dos primeiros médiuns umbandistas, ainda afeiçoados à religião dominante, na época.

Umbanda é, portanto, o produto de uma evolução religiosa. Suas origens encontram-se nas filosofias orientais – fonte inicial de todos os cultos do mundo civilizado – e sua implantação, em nossa terra, deu-se com a fusão das práticas, dos conceitos e crenças do negro, do branco e do índio.

Mas voltemos a 16 de novembro de 1908.

Através de Zélio manifestou-se, nessa mesma noite, um Preto Velho, Pai Antônio, para completar as curas de enfermos iniciadas pelo Caboclo. A partir dessa data, a casa da família de Zélio tornou-se a meta de crentes, descrentes, enfermos e curiosos.

Os enfermos eram curados; os descrentes assistiam as provas irrefutáveis; os curiosos constatavam a presença de uma força superior e os crentes aumentavam, dia a dia.

A figura de Cristo centralizava o culto, que aproveitava muitos elementos das crenças negra e nativa. Sua doutrina de amor e de perdão era a diretriz dessa religião nova, que falava de perto ao coração dos humildes, anulando preconceitos, nivelando o doutor e o operário, o general e o soldado, a senhora e a sua serviçal.

A retribuição monetária pelos trabalhos de cura de enfermos e obsedados não era admitida, nem mesmo sob forma de presentes.
- Ninguém poderá dizer que eu recebi um tostão pelas curas feitas na Tenta da Piedade – contava Zélio – E só de obsedados foram mais de onze mil...

Médiuns, recusados em centros espíritas porque recebiam entidades que se apresentavam nas formas de índios ou de escravos, aderiram ao novo culto. Deu-se a recuperação imediata de enfermos, cuja doença, considerada mental, nada mais era do que a manifestação mediúnica. E houve eclosões espontâneas de mediunidade – como ocorreu com João Severino Ramos – às margens do Rio Macacu, onde o Caboclo das Sete Encruzilhadas trabalhava, usando água pura como elemento de atração pelos Guias e de purificação para os médiuns.

Os sacrifícios de aves e animais não eram admitidos. São palavras textuais de Zélio:

- O Caboclo das Sete Encruzilhadas nunca mandou sacrificar bichos para me fortalecer, ou aos guias de que trabalham comigo.
Cinco anos mais tarde, manifestou-se o Orixá Mallet, exclusivamente para a cura de obsedados e combate aos trabalhos de magia negra.

- Na época imperava a feitiçaria – explicava Zélio – trabalhava-se muito para o mal, através de objetos, aves e animais sacrificados, que representavam o elemento material para levar a magia ao Espírito. Tudo a preço elevadíssimo. Para combater esses trabalhos de magia negativa, o Caboclo trouxe outra entidade, o Orixá Mallet, que destruía esses malefícios e curava obsedados. Ainda hoje isso existe; há quem trabalhe para fazer ou desmanchar feitiçarias, só para ganhar dinheiro. Os meus Guias nunca permitiram que se cobrasse um centavo pelos trabalhos realizados. No espiritismo não se pode pensar em dinheiro; deve-se pensar em Deus e no preparo da vida futura."

"Origem da Umbanda - Módulo I" - Padrinho Juruá